Seu amor e comprometimento com o judaísmo foram de extrema importância para a história dos judeus, pois influenciaram de forma determinante a vida e as ações de seu marido, Sir Moses Montefiore, grande filantropo inglês e um dos judeus mais notáveis do século XIX.

O casal Montefiore usou suas posses, influência e tempo para ajudar seu povo onde fosse necessário, particularmente se o pedido vinha da Terra de Israel. Judith Cohen Montefiore nasceu em Londres, na Inglaterra, acredita-se em 1784. Jovem bonita e talentosa, era a segunda filha de Levi Barent Cohen, proeminente comerciante ashquenazita originário da Holanda. Em 10 de junho de 1812, Judith casou-se com Moses Montefiore, um bem-sucedido empresário sefaradita. Através do casamento, Montefiore tornou-se cunhado de Nathan Mayer Rothschild, gênio financeiro da época, que casara com a irmã de Judith. A sociedade com o cunhado contribuiu para fazer de Montefiore um homem muito rico. A partir de 1824 afasta-se parcialmente dos negócios, mantendo-se apenas em vários Conselhos. Dispunha de tempo e dinheiro para se dedicar às necessidades de seu povo e para viajar sua grande paixão ao longo de toda a vida. Sua amizade pessoal com a rainha Vitória e sua extraordinária generosidade fizeram dele o último dos shtadlaim, ou judeus da corte homens cuja proeminente posição sócio-econômica lhes permitia interceder junto a governos e reis. Sob sua liderança, os judeus ingleses passaram a ser uma espécie de porta-vozes dos judeus de toda a Europa. Sua atuação o levou a países como Síria, Rússia, Egito, os Bálcãs e África. Visitou sete vezes a Terra de Israel. Durante toda sua vida, Judith foi um grande incentivo para o marido, sempre o acompanhando.

Amor pelo judaísmo 

Judith recebeu instrução em assuntos seculares e judaicos. Estudou letras, música, canto, desenho e literatura inglesa, assim como várias línguas. Falava fluentemente francês, alemão e italiano, além de ler e traduzir o hebraico, fato que se tornou de grande ajuda nas várias missões de Montefiore para atender os pedidos de ajuda de diversas comunidades judaicas ao redor do mundo. Sua educação religiosa incluiu o estudo da Torá e das principais orações. Judith sempre foi muito ligada à religião e seguia com afinco as leis do judaísmo: rezava diariamente, respeitava as leis da cashrut e comparecia à sinagoga no Shabat e nas datas religiosas. Para ela, o Shabat era um dia especial e, além de se abster de todo trabalho como manda a Torá jamais deixou de acender as velas. Era uma época em que a Haskalá (o Iluminismo judaico) e os sonhos de emancipação fizeram muito judeus se afastar das sinagogas e da prática da religião. Apesar de poucas mulheres freqüentarem as sinagogas, Judith era uma presença constante. No decorrer de sua vida, em suas viagens a outros países, lastimava ver que poucas mulheres as freqüentavam.

Os ensinamentos judaicos foram a base de seu senso de responsabilidade com seu povo e das crenças que nortearam sua vida. Seu amor pelo judaísmo influenciou de forma decisiva o marido e, conseqüentemente, a história do povo judeu. Durante a juventude Moses Montefiore havia sido como outros judeus emancipados um tanto negligente no que dizia respeito às leis judaicas. Na Inglaterra do século XIX diferentemente de outros países da Europa os judeus eram emancipados socialmente, apesar de serem geralmente exclusos (como os católicos) da vida política. Podiam viver praticamente onde quisessem e eram livres de seguir quase todas as profissões. Famílias como os Rothschild, Goldsmith, Salomon e Montefiore tornaram-se proeminentes social e economicamente .

Mas a influência de Judith e a primeira viagem que o casal fez à Terra de Israel, em 1827, mudaram-no completamente. Montefiore tornou-se um judeu observante, além de um assíduo freqüentador dos serviços diários na sinagoga, prática que o acompanharia até o fim de seus dias. Ao longo de sua vida, o casal seguiu as leis judaicas, respeitando-as mesmo durante suas viagens. Conta-se que um shoet os acompanhava sempre.

O casamento

O casamento entre Judith e Moses foi muito harmonioso, fato que ambos revelam em várias ocasiões, em seus diários. Seus ideais os uniram por 50 anos. O casamento entre askhquenazitas e sefaraditas era um fato raro à época, mas apesar de terem sido educados em culturas diferentes, formavam um par perfeito. Este fato tornou-se uma bandeira na vida do casal, que queria mostrar ao mundo que não havia diferenças reais entre os judeus. 

Judith era uma esposa apaixonada, chamava seu marido afetuosamente de “Monte”. Sendo uma companheira em todos os momentos, ela foi dedicada e leal a ele até o fim de sua vida. Dois dias após o seu casamento, escreveu: “Não me ocorre nada que me desse mais prazer do que perceber que meu querido Monte tem uma inclinação religiosa. Possui algo, que em minha opinião, é verdadeiramente essencial um sentimento de amor ao próximo e benevolência”. Ao reler seu diário, em dezembro de 1825, observou: “Lendo atentamente as páginas anteriores, escritas durante o primeiro mês de meu casamento, não poderia reter as lágrimas pela variedade de sentimentos de alegria e tristeza alegria por ter saúde e prosperidade e o bom e digno marido de minha escolha”. E tristeza por não terem tido filhos. Este fato foi decorrente, provavelmente, da queda de uma escada, quando criança. Judith concentrou todo seu esforço e trabalho aos cuidados com órfãos e na educação de meninas. 

O casal Montefiore sempre atribuiu sua prosperidade às bênçãos de D’us e considerava sua obrigação acudir os menos afortunados. Profundamente envolvidos com a arrecadação de fundos para as causas judaicas e não-judaicas, suas ações humanitárias os tornaram uma referência para as atividades filantrópicas em Londres e ao redor do mundo. Moses Montefiore foi condecorado pela rainha Vitória com o título de barão, em reconhecimento por seus serviços à comunidade judaica. A partir de então, Judith passou a ser conhecida pelo título de “Lady”. Era a mulher mais amada e admirada entre todos os judeus ingleses.

Sir Montefiore creditava grande parte de seu sucesso à esposa, que sempre o aconselhava e incentivava. Em 1870, ao recordar suas realizações, Sir Montefiore agradeceu a Judith: “Não sou um grande homem. O pouco de bom que eu realizei, ou melhor, que eu tenha pretendido realizar, devo a minha inesquecível esposa, cuja fé e entusiasmo por tudo o que fosse nobre sustentaram-me em minha carreira”. 

As missões em prol de seu povo

Judith acompanhou o marido em todas as suas inúmeras missões ao exterior até 1859, assessorando-o em seu trabalho com suas aptidões lingüísticas. Em 1827 realizou o sonho de sua vida, acompanhando-o em sua primeira viagem à Terra de Israel.

No século XIX, as viagens para a então Palestina, sob domínio turco, eram difíceis e perigosas e quase nenhuma mulher se arriscava a fazê-las. Apesar disso Judith foi e após sua visita ao túmulo de Rachel, anotou em seu diário, que, “aparentemente, apenas seis mulheres haviam visitado a Palestina no decorrer desse século”. 

Para chegar a seu destino, os Montefiore tinham que atravessar muitas terras em carroças e a cavalo. Passavam por desertos e montanhas onde nenhuma estrada jamais fora construída. Devido à guerra entre Grécia e Turquia, era muito perigoso viajar de barco pelo mar Mediterrâneo. Havia epidemias, pragas de ratos e ladrões por todos os lados. Judith ficava sempre emocionada quando chegava à Terra de Israel e suspirava aliviada por terem conseguido realizar a façanha com segurança.

Em 1840, Judith acompanhou o marido e uma comitiva de personalidades judaicas (entre elas Adolphe Crémieux) a Damasco. A missão era de extrema importância: liberar judeus que haviam sido presos sob a falsa acusação de “assassinato ritual”. O sucesso da missão fez com que o nome Montefiore se tornasse uma lenda e uma fonte de esperança para muito outros judeus. 

Em 1846, os Montefiore foram à Rússia para tentar persuadir o czar Nicolau I e as autoridades a abrandar a perseguição sobre a população judaica local. Durante a viagem foram infatigáveis nos esforços para aliviar a miséria que viam a seu redor. A esposa e a filha do governador russo visitaram Lady Montefiore e ressaltaram a admiração que ela despertou em todas as classes sociais.

Os Montefiore e a Terra de Israel

Desde sua primeira viagem à Terra de Israel, Judith e Moses Montefiore constataram como era miserável a vida da maioria dos judeus. Muitos estavam em pequenos assentamentos judaicos sem recursos. Outros passavam os dias estudando a Torá e o Talmud. Grande parte de sua renda era composta do pouco que suas mulheres ganhavam, costurando ou lavando. Para aqueles que queriam trabalhar, não havia empregos. Ficavam na dependência da caridade de judeus ricos europeus para conseguir sobreviver. Depois de séculos de exílio, os judeus nada sabiam sobre agricultura para poder cultivar aqueles pântanos e desertos. Sir Moses concebeu um plano de ajuda ao desenvolvimento agrícola nos assentamentos. Ele acreditava que, desta forma, os judeus poderiam tornar-se auto-suficientes e não depender de caridade.

Em sua segunda viagem, em 1838, Judith já era conhecida e admirada entre os judeus de Eretz Israel. Ao visitaram a Terra Santa novamente, em 1855, deram uma grande contribuição para ajudar a construir o primeiro assentamento agrícola fora dos muros de Jerusalém. Foi chamado de “Yemin Moshe”, em homenagem a Moses (Moshe, em hebraico) Montefiore.

Entre as viagens, Moses e Judith moravam em Ramsgate, na Inglaterra, onde ela morreu, em 1862. Em sua memória, Sir Moses fundou uma escola com o nome de sua amada esposa, voltada ao aperfeiçoamento de estudos judaicos. Algo mais do que adequado para uma mulher que usou seu tempo, sua posição e suas posses para ajudar seus irmãos, em todas as partes do mundo.

Bibliografia
• Tauz Emily & Henry, Sondra, Remarkable Jewish Women 
• Sir Moses Montefiore 1784-1885 by Mystle Franklin & Michael Bor
• Johnson, Paul, A História dos Judeus, Editora Imago