Quando, alguns dias após o início do mês judaico, avista-se a Lua, recita-se uma bênção denominada Kidush Levaná.

No caso dos astros, uma bênção mensal é recitada somente sobre a Lua, pois além de ser o astro mais próximo de nós, sua luz ilumina a noite. E, diferentemente do Sol, que ilumina de forma constante e uniforme, a Lua tem um período em que não é vista. Por isso, quando ressurge e volta a banhar a noite com seu brilho prateado, entoamos nossa gratidão a D'us. ( N.R. A bênção do Sol é por sua vez feita de 28 em 28 anos quando recitamos uma bênção agradecendo a D´us pelo sol. A próxima ocorrência será em 2009.)

Kidush Levaná é um mandamento da Torá. É um importante ritual judaico que não deve ser confundido com o Kidush HaChodesh - a antiga prática do Sanhedrin - a Corte Suprema de Israel - que proclamava o dia em que se iniciava um novo mês judaico. O Kidush Levaná não afeta o calendário judaico e é um mandamento que, ao contrário do Kidush HaChodesh, aplica-se a todos os judeus do sexo masculino.

O Talmud discute e elucida a bênção de Kidush Levaná. Há várias leis que definem quando e como deve ser recitada. Apenas os homens ou os meninos que já saibam recitar as bênçãos têm a obrigação de recitar o Kidush Levaná. Por ser um mandamento positivo, as mulheres são isentas de seu cumprimento. A berachá deve ser recitada no mínimo três dias - e, no máximo, quatorze dias - após o molad - a Lua nova. Segundo o costume sefaradita e chassídico, baseado em obras cabalísticas, este período é de sete dias após o molad.

A bênção da Lua só pode ser feita à noite, após o surgimento das estrelas: mesmo que um minian - o grupo de dez homens judeus - já tenham rezado Arvit, a oração da noite, deve-se aguardar o anoitecer. O Kidush Levaná é recitado apenas quando a Lua está visível, de preferência após o término do Shabat. É importante, mas não necessário, recitá-lo na presença de um minian ou de, pelo menos, três outros homens judeus. Se uma pessoa estiver enferma, pode até dizer a berachá sozinha, em seu lar. Mas é necessário que enxergue a Lua através da janela ou da porta aberta.

Há, basicamente, dois motivos para o mandamento de Kidush Levaná. O primeiro diz respeito a D'us; o segundo, ao povo judeu. No Talmud, Rabi Yochanan ensina que aquele que recita a bênção da Lua é como se estivesse saudando a Presença Divina - a Shechiná. Um dos maiores sábios de nossa história, Rabeinu Yoná, explicou que quando saudamos a Lua, estamos saudando seu Criador, Mestre do Universo. Pois, como o rei David decanta em seus Salmos, pode-se perceber e apreciar a grandeza de D'us através de cada um dos elementos de Sua criação.

O segundo motivo para esse ritual é que a Lua simboliza a história do povo judeu. Aos nossos olhos, a Lua parece diminuir, chegando até a desaparecer completamente; mas sempre volta a crescer até chegar à fase de Lua Cheia. Este ciclo lunar simboliza a história de nosso povo. Houve épocas de escuridão - perseguições, opressão e assimilação. Mas os filhos de Israel sempre voltam a crescer física e espiritualmente. Quando a luz do judaísmo parece estar em perigo, prestes a ser ocultada, há uma reviravolta: toda queda é seguida por uma grande ascensão. Como a Lua Cheia numa noite de escuridão, o povo judeu - que nas palavras do profeta Isaías é a "luz entre as nações" - tem o mandado Divino de iluminar o mundo.

A Lua ensina o povo judeu a ter fé em D'us. Este tema é especialmente enfatizado em nossas orações do Shabat, quando recitamos, "pela manhã, cantarei Seus louvores, (mas) fé eu terei à noite" (Salmos 92:3). Simbolicamente, é durante a noite, que representa a severidade e as dificuldades, quando mais precisamos de fé. A Lua ilumina a noite, lembrando-nos ser a vida um ciclo, como uma Fonte de Luz e Esperança constantes que rege o Universo. Não é de surpreender que o primeiro mandamento dado por D'us ao povo judeu, mesmo antes do Êxodo do Egito, refere-se ao Rosh Chodesh - o novo mês - determinado pela Lua.

Por ser um tributo a D'us e ao povo judeu, o Kidush Levaná deve ser realizado com alegria. Um dos motivos pelos quais deve ser recitado de preferência após o Shabat é que os homens estão vestidos em seus belos trajes.

No mês de Menachem Av, o Kidush Levaná só é recitado após Tishá B'Av - o nono dia do mês. Em Tishrei, o mês que se inicia com Rosh Hashaná, a bênção só pode ser dita após Yom Kipur. A razão disto é que os sentimentos de tristeza que permeiam os primeiros dias de Av e a introspecção necessária durante os Dias de Julgamento não condizem com o sentimento de grande alegria inerente à berachá da Lua.

Durante a Santificação da Lua, pedimos a D'us que Ele nos proteja de nossos inimigos e que estes passem a temer o povo judeu. Após proferirmos estas palavras, dirigimo-nos a três pessoas e dizemos "Shalom Aleichêm": "Que a paz esteja entre vós", indicando que não nos estamos dirigindo a inimigos em nossa comunidade ou um povo. O Midrash revela uma outra explicação mística para este desejo de paz. Explica que a Lua tinha sido criada do mesmo tamanho que o Sol, mas teria reclamado a D'us: "O mesmo reino não pode ser regido por dois soberanos". Ao que D'us teria respondido: "Então, você, diminua em sua grandeza". Na Era Messiânica, a Lua "fará as pazes" com o Sol e D'us lhe devolverá todo o seu esplendor original. Conforme está descrito no texto de Kidush Levaná, a Lua terá a mesma grandeza e brilho que o Sol.

É muito importante ressaltar que esta bênção não é um culto à Lua. Os idólatras da antigüidade rezavam para a Lua e para outros astros celestiais, pois acreditavam que o mundo era regido por eles. O judaísmo proíbe isto terminantemente. Portanto, para que o Kidush Levaná não seja mal-interpretado, ele é seguido da reza "Alenu", que se inicia com as palavras: "É nossa obrigação louvar o Senhor de tudo". O último parágrafo desta reza termina com a afirmação que "Ein Od" - não há nada em nosso mundo - nem no Céu, nem na Terra - digno de ser adorado, além do Todo-Poderoso.

A gratidão é uma virtude intrínseca ao judaísmo. O povo judeu abençoa a D'us todos os dias do ano, louvando e agradecendo a Ele por todas Suas maravilhas e bondades. A Lua sempre foi de grande utilidade para o homem. Portanto, quando ela se renova a cada mês, emitindo luz que beneficia nosso mundo, nós, judeus, recitamos o Kidush Levaná. Através desta benção, afirmamos nossa fé em D'us e nossa confiança no brilho do povo judeu que, como a Lua Cheia, em toda a sua plenitude, "deve ser uma luz entre os povos".