Nos últimos meses, uma coalizão de países se formou a fim de livrar o planeta de uma grande ameaça à estabilidade global: as ambições nucleares do Irã.

Os planos de Teerã provocam especial preocupação em Israel, mas também cresce no mundo a convicção de que corresponde a um risco grande e inaceitável permitir a um regime autoritário e extremista contar com atividades nucleares que possam servir de fachada para a produção de armas atômicas.

O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, já defendeu a destruição de Israel e questionou a existência do Holocausto. Essas afirmações absolutamente inaceitáveis provocaram repúdio internacional. E sua chegada ao poder, em 2005, sinalizou que o regime iraniano, instalado com a revolução islâmica de 1979, radicaliza suas posições, num movimento responsável por trazer mais instabilidade e incerteza ao Oriente Médio e ao cenário global. Na atual crise nuclear, Teerã, em abril, ignorou apelos do Conselho de Segurança da ONU para mudar seus planos e já colocou dificuldades para o trabalho da Agência Internacional de Energia Atômica, braço das Nações Unidas responsável por uma ação de fiscalização ao redor do planeta.

Num primeiro momento, em 2003, os Estados Unidos e Israel se destacaram entre os países que dispararam o alarme da preocupação diante da ameaça de um Irã com arsenal nuclear. Alemanha, França e Reino Unido, em 2004, decidiram assumir uma posição mais ativa e intervieram como "bombeiros", na tentativa de liderar uma negociação que levasse o governo iraniano a abrir mão de seus projetos nucleares. O trio europeu, no entanto, recebeu como resposta um endurecimento da posição de Teerã, o que levou Berlim, Paris e Londres a se aproximarem, no ano passado, das idéias defendidas por Washington e por Jerusalém.

A estratégia norte-americana se apóia em conseguir, se possível, um recuo do Irã por meio de negociações diplomáticas, oferecendo a Teerã, por exemplo, uma melhora nas relações bilaterais em troca do fim do programa iraniano de enriquecimento de urânio. No mês de maio, os Estados Unidos anunciaram que, depois de mais de duas décadas de rompimento, normalizavam finalmente suas relações diplomáticas com a Líbia, num movimento que incluía vantagens políticas e econômicas para Trípoli.

A aproximação se deu principalmente depois que o dirigente Muamar Khadafi, em 2003, decidiu abrir mão de seus programas de armas de destruição em massa, num gesto de pragmatismo arquitetado para melhorar suas relações com países ocidentais e, assim, tirar a Líbia de um longo isolamento diplomático e econômico.

A Casa Branca espera, embora com reduzidas esperanças, que o caminho de Khadafi possa ser copiado pelo regime de Teerã.

No caso de fracasso desse plano, os Estados Unidos querem pressionar o Irã por meio da adoção de sanções políticas e econômicas determinadas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. A idéia de uma opção militar dos EUA desponta hoje muito mais como forma de pressão do que como uma hipótese concreta, por conta da dificuldade das forças armadas norte-americanas, já bastante envolvidas no Iraque e no Afeganistão, de abrirem mais uma frente, ainda que para ser utilizada com as chamadas "ações cirúrgicas", de rápidos bombardeios aéreos.

Mas a lógica dos EUA, França, Reino Unido e Alemanha, de que as sanções podem ser uma ferramenta eficiente para pressionar o Irã, esbarra na ação da Rússia e da China - integrantes do Conselho de Segurança da ONU com poder de veto. Moscou e Pequim também entendem que um Irã com arsenal nuclear representa um risco para a comunidade internacional e já pediram a Teerã que abra mão de suas ambições atômicas. No entanto, os governos russo e chinês não querem as sanções porque colecionam importantes interesses econômicos no Irã e temem perdas significativas, se a crise chegar à imposição de embargos.

A Rússia vende armas e tecnologia nuclear ao Irã, que argumenta que seu programa atômico tem fins pacíficos, voltados para a produção de energia. Argumento bastante questionável para um destacado produtor de petróleo. O temor é que as instalações nucleares possam servir de fachada para uma atividade clandestina de produção de armas atômicas.

E se Moscou teme perder um cliente importante, Pequim se preocupa com a possibilidade de ficar sem a compra de petróleo iraniano, num cenário de sanções internacionais contra Teerã. A economia chinesa, com seu crescimento frenético, se transformou em voraz consumidora de energia.

A coalizão internacional, portanto, se divide em dois grupos. De um lado, EUA e países europeus defendem uma atitude mais enérgica em relação ao Irã. Já China e Rússia preferem uma abordagem mais branda. Cabe a todos esses países, apesar das diferenças, a iniciativa de levar adiante uma ação que impeça a proliferação nuclear. Já ameaçada pelo fantasma do terrorismo, a comunidade internacional tem a obrigação de agir para impedir a proliferação de armas de destruição em massa, em especial nos países que não apresentam compromisso sólido com a estabilidade internacional. Não é possível, nesse campo da proliferação, correr riscos.

O avanço de ambições nucleares do Irã assusta, também, países muçulmanos. Rivalidades regionais podem desencadear uma corrida armamentista que leve nações como Arábia Saudita e Egito, entre outros, a buscar arsenal atômico, a fim de conseguir o chamado "equilíbrio estratégico".

As estimativas sobre o prazo necessário para o Irã obter uma bomba atômica variam. Algumas falam já em 2007, enquanto outras apontam a necessidade de até mesmo dez anos.

O uso de tecnologia nuclear para fins pacíficos e para produção de energia é um direito de países que tenham um regime responsável, comprometido com a estabilidade global, e que aceitem se submeter a amplos e rigorosos padrões de fiscalização internacional. O Irã do presidente Mahmoud Ahmadinejad está longe de se enquadrar nesses critérios.

O jornalista Jaime Spitzcovsky é editor do site www.primapagina.com.br. Foi editor internacional e correspondente em Moscou e em Pequim.