No último mês de novembro, um fragmento de uma das folhas de pergaminho do Códex de Alepo foi entregue ao instituto Ben-Zvi, de Jerusalém, instituição que desde 1958 abriga o que resta do antigo manuscrito.

O Códex de Alepo, chamado em hebraico de Keter Aram Tsoba, datado do século 10 E.C., é o mais antigo e completo manuscrito conhecido da Torá. É, também, a fonte mais autorizada e precisa, tanto do texto bíblico como do sistema massorético de vocalização e acentuação. Isto o torna o manuscrito de maior valor religioso e científico, entre outros vários. O Keter é composto por folhas de pergaminho de 33 x 26,5 cm. O número exato de páginas é desconhecido, mas supõe-se que eram 480, das quais restam apenas 295 páginas - as demais desapareceram durante o Pogrom de Alepo, em 1947 (ver pág. 19).

O fragmento entregue ao Instituto Ben-Zvi mede oito centímetros quadrados e possui inscrições dos dois lados, trazendo em sua pequena área versos do capítulo 8 do Livro Êxodo, incluindo as palavras Divinas transmitidas por Moisés ao Faraó, no Egito: "Deixe partir o Meu povo, para que possam Me servir...".

Este pequeno pedaço do famoso manuscrito estava em mãos de Sam Sabbagh, judeu de Alepo, desde dezembro de 1947, quando o encontrou em meio aos destroços da Grande Sinagoga. Em depoimento feito a representantes do Instituto Ben-Zvi, sobre como o encontrara, Sabbagh afirmou: "Vi as páginas danificadas pelo fogo espalhadas no chão. Poderia ter pego todas as que restavam, mas minhas mãos tremiam de horror e de medo diante do que via. Cheguei a pensar que os sírios nos massacrariam assim como os turcos haviam massacrado os armênios. Então, peguei apenas um dos fragmentos, aquele que estava mais afastado, e o guardei comigo por anos e anos".

Sam Sabbagh manteve aquele pequena parte do Keter sempre consigo, por quase seis décadas, até seu falecimento. Acreditava que o fragmento o protegera nos momentos mais difíceis de sua vida, inclusive em 1948, durante a Guerra de Independência de Israel. E, quando chegou, em 1968, aos Estados Unidos, ajudou-o a refazer a vida no Brooklyn. Estava com ele, também, quando se submeteu a uma complicada cirurgia.

O Instituto Ben-Zvi tomou conhecimento, em 1987, de que um fragmento do Keter estava com Sabbagh. Na época, o professor Menahem Ben-Sasson, então presidente da entidade, viajou aos EUA para conseguir fundos para a restauração do Códex junto a Steve Shalom, líder comunitário norte-americano oriundo de Alepo. Ben-Sasson lembra que "enquanto conversava com Shalom, outro membro da comunidade se aproximou e disse que o Códex havia sido queimado, mas que seu irmão, Sam, tinha uma folha. Entrei logo em contato com Sam, mas ele me disse que não estava disposto a abrir mão do fragmento, pois este o salvara de desastres. Pedi, então, permissão de fotografá-lo e ele concordou".

Pesquisas feitas por especialistas em Israel, após verem a foto, confirmaram a autencidade do documento. Era realmente parte do Códex de Alepo.

Há dois anos, Sam Sabbagh faleceu. Apesar de ter concordado em doar, após sua morte, o fragmento ao Instituto, em Israel, as negociações com a família demoraram até que isso acontecesse, de fato, segundo conta Zvi Zameret, diretor do Ben-Zvi. No dia 1 de novembro último, o fragmento foi entregue a um representante da instituição pela filha de Sam Sabbagh, Rachel Magen.