Quando, em 1932, Aaron Russo emigrou de Salônica, Grécia, aos dezoito anos, não imaginava que 52 anos mais tarde se empenharia em levar os arquivos de sua comunidade para a Universidade de Tel-Aviv, via Moscou.


Russo, um engenheiro que vive atualmente em Israel, é o presidente do "Centro de Investigação dos Judeus de Salônica". Teve um papel fundamental em encontrar os arquivos e levantar os fundos necessários para reproduzi-los e enviá-los a Israel.

"É um milagre", disse Russo na cerimônia realizada na Universidade de Tel Aviv, para a assinatura do acordo entre a Universidade e o "Centro de Arquivo de Coleções de Documentos Históricos de Moscou". Este acordo permite ao "Instituto de Investigação da Diáspora" fotografar os arquivos, que se encontram na Rússia, das comunidades judaicas da Grécia - com aproximadamente 200.000 documentos. "Espero que este seja só o primeiro passo para um projeto de maior alcance, que é o de trazer a Israel os documentos restantes desta comunidade exterminada no Holocausto", disse.

A professora Minna Rozen, diretora do "Instituto de Investigação da Diáspora" da Universidade de Tel Aviv, encarregou-se das difíceis e prolongadas negociações - um esforço de dois anos - que conduziram ao acordo. "Trata-se de um projeto de características únicas considerando-se a enorme quantidade de material, a sofisticação do equipamento fotográfico e, especialmente, a qualidade e a importância do material, que a abrange o período de 1880 a 1941", disse a profª. Rozen.

Capturados pelos nazistas

Os arquivos das comunidades judaicas das Grécia foram confiscados pelos nazistas pouco depois da ocupação deste país, em 1941. A maior parte do material foi transferida para Frankfurt, onde já se encontravam arquivos de outras comunidades e indivíduos judeus. Quando a guerra terminou, os arquivos não foram encontrados em Frankfurt e durante 50 anos foram considerados como perdidos. Havia rumores de que, devido aos bombardeios dos aliados em Frankfurt, os alemães teriam levado os documentos para o Castelo de Althauf, na Silésia, posteriormente Alemanha Oriental, mas não houve maneira de confirmar a veracidade disto.

Existem muitas teorias sobre a insistência dos nazistas em colecionar arquivos e documentos de comunidades que aniquilavam. Uma teoria diz que os alemães desejavam documentar o desaparecimento do povo judeu e criar um museu de cultura judaica. Outra, que queriam fundamentar o genocídio com documentação histórica. A profª. Rozen propõe outra hipótese: os alemães juntavam material e arquivos pessoais das últimas quatro gerações, com a finalidade de utilizá-los como fonte para o processo de purificação racial.

Escondidos pelos russos

No princípio da década de 90, começou a se esclarecer o mistério do desaparecimento dos arquivos. Aparentemente, o Exército Vermelho encontrou um trem, próximo ao Castelo de Althauf, em 1945, com material desconhecido. Moscou ordenou que o material fosse levado para a Rússia e depositado em um edifício onde se encontravam outros documentos obtidos de maneira similar. Os arquivos foram secretamente administrados pela KGB e sua existência foi ocultada do público. "Os arquivos foram catalogados e organizados, mas durante 50 anos ninguém solicitou vê-los", disse a profª. Rozen.

Em 1991, Rozen soube da existência dos documentos e viajou a Moscou. "A princípio, não me deixaram entrar no edifício, mas quando finalmente pude ver o tesouro, ainda tive que aguardar mais 6 meses até que o Curador do Estado da Rússia aceitasse reunir-se comigo".

Foram necessários dois anos e a intervenção de várias figuras públicas para chegarem a um acordo. A execução do projeto custou US$ 250.000, que foram doados por Russo, pela família Recanati, por israelenses oriundos de Salônica e pela Universidade de Tel-Aviv.

"Obter este material e trazê-lo até Israel é uma mitzvá, uma obrigação", disse o professor Yoram Dinstein na cerimônia. "Israel é o lugar adequado para guardar e analisar os arquivos. Aqui ergueremos um monumento para a grande comunidade judaica de Salônica, exterminada no Holocausto".

Os arquivos contêm livros da comunidade, registros de nascimentos e de falecimentos, fotografias de todos os judeus de Salônica e correspondência com diversas instituições da Palestina, então dominada pelos britânicos, incluindo a "Agência Judaica" e a "Oficina de Imigração Judaica". O processo de fotografia dos documentos levará aproximadamente dois anos. Posteriormente, o material será catalogado em um programa de multimídia computadorizado.

Em 1941, foram enviados 45.000 judeus de Salônica a Auschwitz. Somente 1.300 sobreviveram e a maioria destes emigrou para Israel. Até agora, restava apenas a memória dos poucos sobreviventes desta florescente comunidade, conhecida como "Jerusalém dos Bálcãs". O acordo permitirá devolver parte de sua antiga glória.

Extraído e traduzido da revista
"Informaciones de la Universidad de Tel-Aviv"