A comunidade judaica da ilha de Rodes foi quase totalmente destruída durante a Segunda Guerra Mundial. Milhares de seus membros morreram em campos de concentração nazistas e, atualmente, memoriais relembram seu passado.

A ilha de Rodes foi palco da assinatura do primeiro armistício entre Israel e seus adversários árabes em janeiro de 1949. Quando desta assinatura, quase não mais havia judeus na região.

Desde 1923, de acordo com o Tratado de Lausanne, a região de Dodecaneso, na qual localiza-se Rodes, estava sob controle italiano e os simpatizantes do fascismo vinham galgando posições de destaque. A Europa, por sua vez, assistia à ascensão do nazismo. Foi dentro deste contexto que, em 1936, o fascista Mário de Vecchi foi eleito governador das ilhas Dodecaneso. Sua chegada marcou o início de uma série de leis anti-judaicas em Rodes. Ordenou imediatamente aos judeus manter suas lojas abertas no Shabat e nas festas e fechou uma Yeshivá, proibiu o abate de animais segundo o ritual judaico e transformou escolas judaicas em instituições públicas. De Vecchi exigiu que os membros do Conselho Comunitário Judaico visitassem a sede do governo justamente em Rosh Hashaná. No passado, as sinagogas costumavam receber representantes do governo durante as comemorações das Grandes Festas, como um gesto de respeito às suas tradições e ao seu papel dentro da sociedade local. A situação havia mudado. Fazendo uso de sua autoridade como governador, De Vecchi ainda exigiu que cem lápides de túmulos do cemitério judaico fossem entregues para serem usadas como material de construção para sua nova casa.

Na Itália, no dia 1º de setembro de 1938, foram anunciadas uma série de leis anti-judaicas. O abate casher passava a ser proibido, judeus nao podiam comprar propriedades, empregar não-judeus nem tampouco mandar seus filhos para escolas do governo. A população não judaica não podia recorrer a médicos ou farmacêuticos judeus. E essas leis passaram a vigorar em Rodes.

Segundo esta legislação anti-judaica, os judeus que haviam chegado a Rodes após 1919 deveriam deixar a ilha. A medida afetaria diretamente quinhentos judeus vindos da Turquia, Grécia e Bulgária. A data estipulada para sua partida seria 12 de março de 1939. Para impedir a expulsão, um comitê integrado por Abraham Elimelech, David Abulafia e Abraham Franco - vindos de Jerusalém - reuniu-se com De Vecchi.

Durante esse encontro, os visitantes disseram a De Vecchi que a expulsão dos judeus era ilegal já que, segundo as determinações do Tratado de Lausanne, eram considerados cidadãos italianos. Ao ser consultado sobre o caso, o então líder fascista Mussolini permitiu a permanência dos judeus em Rodes. No entanto, a postura anti-semita e as atitudes ambíguas de De Vecchi levaram a maioria dos quinhentos membros da comunidade judaica a partir da ilha rumo a Nápoles, Tânger e Palestina.

Em maio de 1939, um velho navio chegou a Rodes com o intuito de retirar da ilha centenas de judeus ameaçados de expulsão. A embarcação fazia parte da frota que transportava ilegalmente judeus para a Palestina. Porém, logo após sua partida, houve um incêndio a bordo e o navio foi obrigado a retornar a Rodes. Os passageiros partiram, posteriormente, em outro navio.

Novos horrores

Em 1942, o almirante L. Campione foi eleito governador de Rodes. Simpatizante dos judeus, revogou várias medidas anti-semitas. Em 1943, apesar da queda de Mussolini, os problemas da comunidade judaica da ilha não terminaram. Seu sucessor assinou um armistício com os aliados, mas, em 1944, os alemães ocuparam a ilha de Rodes, iniciando a deportação da comunidade judaica.

Por determinação dos alemães, os judeus foram enviados para um campo de concentração perto de Atenas e, em seguida, os sobreviventes foram levados para Auschwitz, onde quase todos pereceram.

Trinta e nove judeus ainda permaneciam em Rodes, tendo conseguido evitar a deportação por causa da nacionalidade turca de suas esposas e da proteção que haviam recebido do cônsul da Turquia. Não conseguiram, no entanto, evitar o terror causado pelas ameaças da Gestapo.

No dia 8 de agosto de 1944, foram avisados que seriam enviados para Atenas, onde sua nacionalidade turca seria contestada. Depois, disseram-lhes que pode-riam ficar, mas suas mulheres e filhos seriam deportados na manhã seguinte. Embora não cumpridas, tais ameaças conseguiam aterrorizá-los.

A derrota dos nazistas despertou sentimentos contraditórios entre os sobreviventes judeus de Rodes. Por um lado, alegria pelo fim do terror; pelo outro, surpresa e tristeza com a extensão da tragédia. Para os judeus da ilha, era uma tarefa quase impossível reconstruir suas vidas. De 1945 a 1947, Rodes esteve sob ocupação militar britânica, passando então a ser governada pelos gregos. Durante esse período, alguns sobreviventes do holocausto fizeram o caminho de volta para Rodes e, em abril de 1946, contavam-se cinqüenta judeus na ilha.

As comunidades de judeus sefaraditas oriundos de Rodes em várias partes do mundo, iniciaram campanhas de arrecadação de fundos para a reconstrução da vida judaica na ilha, mas o resultado não foi muito positivo pois, em 1946, os remanescentes imigraram para os Estados Unidos, África e Palestina.

Atualmente, poucos judeus vivem em Rodes. Muitos memoriais foram erigidos em honra das vítimas da guerra. Em 1933, a família de Salomão Alhadeff havia doado um parque enorme para a cidade de Rodes. O prefeito de então, Alfred Biloti, havia determinado que a rua principal da área levasse o nome de seu doador. Durante o governo de De Vecchi, o nome fora mudado em homenagem a um heróis fascista. Após a guerra, o nome foi novamente trocado e a rua voltou a se chamar Salomão Alhadeff. A rua principal do bairro judeu atualmente chama-se Martyron Evreon - Rua dos Mártires Judeus. Uma placa de mármore foi erigida no cemitério judeu em memória dos dois mil mortos nos campos de concentração da Alemanha.

O fato de ter sido assinado em Rodes o primeiro armistício entre o recém-criado Estado de Israel e os árabes, em 1949, emocionou os judeus que ainda viviam na região.

Que o Estado de Israel tenha assinado o seu primeiro armistício em um lugar onde a vida judaica havia sido totalmente erradicada era um símbolo das experiências da nossa história. Das cinzas emergia uma nova vida; do desespero passado ressurgiam sonhos e esperanças. Muitos outrora habitantes de Rodes ainda guardam fotos nostálgicas do lugar.

Em geral, as comunidades judaicas da Diáspora eram como flores sem raízes. Durante muito tempo, suas floradas resplandeceram, para serem mais tarde brutalmente arrancadas. Em Rodes, raiz e flor foram unidas simbolicamente graças a esse armistício. "O guardião de Israel nunca dorme...".

Baseado no artigo do Dr. Marc D. Angel, publicado no livro "Sephardim and The Holocaust".