Atualmente, há cerca de 27 mil judeus vivendo na Turquia, dos quais 24 mil em Istambul. Localizada na passagem marítima entre o Mar Negro e o Mediterrâneo, Istambul - a tão decantada Constantinopla - é a ponte entre Oriente e Ocidente.

De extraordinária beleza, Istambul não nega a presença judaica. Desde sua fundação pelos gregos, no século VI a.E.C., há judeus na cidade, que, à época, era chamada de Bizâncio.

Esta foi conquistada pelos romanos, passando a fazer parte do Império Romano. A localização da cidade atraiu Constantino que, em 330, a reconstruiu, dando-lhe o nome de Constantinopla. Durante todo esse período os judeus lá continuaram a viver, mas foi somente quando a cidade tornou-se a capital do Império Otomano, seu centro administrativo e comercial, com o nome de Istambul, que a comunidade judaica conheceu dias de esplendor.

Foi na Istambul dessa época que se organizou a maior comunidade judaica do mundo, modelo para todas as outras. Conhecida como a "cidade-mãe" do judaísmo, foi ponto de encontro dos judeus da Diáspora e centro para onde convergiam as doações para ajudar os que estavam em perigo. Era em Istambul que os sultões consagravam o Chaham-Bashi, cuja autoridade se estendia a todos judeus do Império Otomano, inclusive aos que viviam em Eretz Israel. Hoje, a cidade oferece aos visitantes opções turísticas que constituem verdadeira viagem no tempo, tamanha a variedade de objetos encontrados em museus e sinagogas espalhados por quase todo o país. Há 16 sinagogas ortodoxas em funcionamento, das quais três abrem apenas durante o verão. A comunidade mantém também um lar para idosos e um hospital, cemitérios, além de escolas e sete clubes. Em algumas regiões da cidade é fácil encontrar marcas da influência judaica, as construções geralmente revelam a origem de seus fundadores e freqüentadores, trazendo para a Turquia um pouco da Europa sefaradita e asquenazita.

O Bairro de Gálata, por exemplo, também chamado de "Pera", onde Benjamim de Tudela encontrava-se com judeus em 1176, fica no lado europeu de Istambul, do ponto de vista geográfico e cultural, e se localiza ao norte do estuário conhecido como Corno de Ouro. Foi neste bairro que a vida judaica local iniciou-se em tempos bizantinos, quando Gálata era uma cidade murada, separada, do outro lado de Constantinopla, com o estuário entre ambas.

Após a conquista otomana, em 1453, foram chegando muitos judeus e, em especial, sefaraditas, a partir de 1500. Lá permanecem até hoje, apesar de também estarem espalhados por outros locais. Ainda no século 20, que mal termina, Gálata ressoava, alegre, aos sons e ruídos típicos dos jogos de rua, vindos de crianças que falavam em ladino.

Próximo a essa região, estão algumas das mais conhecidas sinagogas de Istambul - a Nevê Shalom, a Sinagoga Asquenazita e uma outra, a Sinagoga dos Italianos; além da sede do rabinato central, a Sinagoga Zulfaris, datada de 1671 e já transformada em museu. Cada uma destas sinagogas conta um pouco da história dos judeus na região.

A Nevê Shalom, por exemplo, inaugurada em 25 de março de 1951, é uma das maiores da cidade e foi projetada e decorada em estilo moderno. Em 1986, foi palco de atentado terrorista que matou 22 pessoas. No hall interno é possível se ler a lista das vítimas e ver um relógio que marca a hora exata em que ocorreu o ataque - fazendo com que parasse de funcionar.

Como poucos judeus vivem atualmente em suas redondezas, a sinagoga funciona apenas para casamentos e velórios. A Sinagoga Asquenazita, com três arcos orientais e janelas octogonais, possui um domo azul reluzente e um Aron Hakodesh feito de ébano. Esta sinagoga foi construída no início do século XX, para receber os refugiados vindos de Kishinev, na antiga Rússia. A Sinagoga Italiana, por sua vez, data de 1880 e possui fachada gótica. Lustres de cristais, cortinas de veludo e tapetes turcos enfeitam o interior.

Outra área que revela a história judaica em Istambul é o bairro de Balat. Foi nesta área que floresceu uma comunidade judaica desde os tempos do Império Bizantino e que, até as primeiras décadas do século XX, era o centro espiritual judaico. Das 19 sinagogas que um dia lá existiram, apenas duas permanecem funcionando, incluindo a Sinagoga Ochrida, a mais antiga de Istambul. Segundo pesquisadores, foi assim chamada em lembrança à cidade de Ochrid, na Macedônia, local de origem da maioria de seus freqüentadores quando de sua fundação, em meados do século XV. O prédio foi restaurado com base em projetos datados do século XVII. Um dos principais diferenciais desta em relação às demais existentes no país é a sua bimá, em forma de arca. Para alguns, esta representaria a Arca de Noé; para outros, os navios que trouxeram os sefaraditas da Espanha.

Na mesma região, está a Sinagoga Yambol - ou Yanbol, assim denominada em referência à cidade macedônia, representada em uma pintura no teto. Com tapetes turcos, cadeiras almofadadas ao redor da bimá, localizada no centro do prédio, constitui um ambiente extremamente aconchegante. A Etz Hayim, também em Istambul, está em uma área que um dia abrigou três sinagogas - duas sefaraditas e uma asquenazita. A maior das três construções, uma das sefaraditas, foi destruída por um incêndio acidental, em 1941, mas restos de suas paredes de mármore ainda podem ser vistos no que seria o pátio.

A Sinagoga Sisli Beth Israel realiza serviços religiosos diariamente e está localizada em uma área próxima à Praça Taksim, onde, atualmente, concentra-se a vida judaica. Nesta mesma região estão o Lar Judaico para Idosos, o Hospital Judaico Or Hayim e o Cemitério Judaico Asquenazita, no qual pode ser visto o monumento em memória das vítimas do atentado à sinagoga Nevê Shalom - uma menorá tridimensional e um muro de tijolos que forma flores em diferentes tonalidades de verde, azul e rosa, intercaladas com Estrelas de David, em amarelo. No centro, uma estrela manchada em vermelho sangue.

Mas Istambul não abriga apenas vestígios religiosos da vida judaica na cidade. Há também edifícios que foram construídos por membros de destaque da comunidade. Entre estes se destaca a mansão do banqueiro Abraham Camondo, também chamado de "o Rothschild turco", datada do século XIX. Uma construção grandiosa branca, no bairro de Haskoy. Abrigando, atualmente, a sede da Marinha turca, não está aberta ao público. Outro exemplo da influência de Camondo é o mausoléu que leva seu nome e a chamada Escadaria Camondo, que liga a região alta à baixa do bairro, também conhecida como Voyvoda Caddesi.

As pedras falam

Poucas ruínas arqueológicas conseguem falar de seu passado como fazem as localizadas em Ismirna e em seus arredores. A partir do século XVII, quando começou a se desenvolver como importante centro para o comércio do Mediterrâneo, Ismirna abrigou uma das mais importantes comunidades judaicas de todo o Império Otomano. A comunidade contava com 15 mil judeus antes de 1948. Atualmente, há apenas 2 mil, concentrados principalmente na área de Alsancak, onde fica a Sinagoga Shaar HaShamayim.

No passado, o coração da vida comunitária era o Bazan. Lá, atualmente, há uma rua conhecida apenas como "927", que, até algumas décadas atrás, chamava-se Rua Havra e abrigava nove sinagogas e muitas lojas pertencentes a judeus. Agora, apenas duas são facilmente encontradas, entre elas, a Sinagoga Seynora, fundada por Doña Gracia, segundo conta a tradição local. De cor predominantemente branca e decorada em ouro e turquesa, esta sinagoga exibe uma rica peça da arte otomana - uma pintura de um vaso com flores. As capas da Torá são em veludo de seda, ornadas com bordado em fios de ouro.

Localizada perto de Ismirna, Éfeso é considerada por muitos arqueólogos uma das cidades da antiguidade melhor preservadas pelo tempo. Apenas um décimo das escavações planejadas para a área já foram realizadas e, para os estudiosos, quanto mais forem feitas, maior será a probabilidade de se encontrar os restos de uma sinagoga. O que já foi encontrado em uma das principais ruas de Éfeso foram os restos de uma biblioteca datada do século II de E.C. Em sua entrada, estão oito colunas e, próximo à parte mais baixa de uma delas, aparece uma menorá em relevo.

Outro sítio arqueológico perto de Ismirna é a antiga cidade de Sardis. Durante o Império Romano, chegou a ter mais de 100 mil habitantes e uma grande e próspera comunidade judaica. Nela os arqueólogos encontraram restos de uma sinagoga datada do século II E.C. Do lado externo do prédio, estava o centro comercial, onde inúmeros judeus possuíam lojas. A própria sinagoga, da qual apenas restam o piso e algumas paredes e colunas, tem grandes proporções. O piso é feito em belíssimo mosaico e suas paredes decoradas são de pedra colorida. A Sinagoga de Edirne, a cerca de 70 quilômetros de Istambul, é outro local que evoca o esplendor do passado judaico. Segundo os pesquisadores, os judeus viveram nesta região antes da queda do Segundo Grande Templo de Jerusalém, tendo chegado a somar 28 mil, no início do século XX. Atualmente, restam apenas quatro famílias. Apesar da sinagoga estar em péssimo estado, ainda pode-se admirar seu estilo arquitetônico. Inspirada na sinagoga de Viena, possui uma fachada com três janelas em forma de arcos, com decoração em ferro, e alguns afrescos nos tons vermelhos, ouro e azul ainda podem ser admirados. No alto, uma Estrela de David.

A cidade de Bursa, capital do Império Otomano antes da conquista de Constantinopla, foi também o centro do comércio internacional da seda, no qual os judeus tiveram intensa participação, enviando seus navios a Veneza, ao Golfo Pérsico, Índia e outros países. Quando os sefaraditas chegaram a Bursa, uniram-se à comunidade de judeus romaniotas, também chamados de bizantinos ou levantinos, lá existente. Antes da I Guerra Mundial havia aproximadamente 3.500 judeus na cidade; hoje há 33 famílias ou meras 133 pessoas. Etz Chayim, a sinagoga mais antiga da cidade, incendiou-se e a chamada Mayor, está trancada. A única que ainda funciona chama-se Guerush e, ao que se sabe, foi construída quando os judeus vieram da Península Ibérica, tendo sido posteriormente restaurada.

Próximo de Dardanelos e não muito distante das ruínas da antiga Tróia está a cidade de Canakkale, a 130 quilômetros aproximadamente de Istambul. No início do século XX, a cidade abrigava cerca de mil judeus, atualmente há apenas 23, entre os quais Sami Kumru, sócio e diretor geral da maior fábrica de alimentos congelados da cidade e uma das mais importantes do país. A Sinagoga Mekor Hayim, que tem quase um século, está trancada, sendo aberta somente durante as festas religiosas ou quando se consegue formar um minian.

Contribuição judaica

A contribuição judaica à sociedade turca é visível em quase todos os setores da vida cotidiana nacional. A ferrovia pela qual viajava o famoso Orient Express - tema de muitos livros da escritora Agatha Christie - foi construída pelo Barão Maurice de Hirsch, o banqueiro e filantropo judeu alemão. Entre os industriais de destaque estão Jak Kamhi, dono da franquia Sony; o jornalista Sami Kohen, do diário Milliyet; os escritores Mario Levi e Jak Deleon. Entre os que emigraram para Israel destacam-se o político Mordecai Gazit e seu irmão, Shlomo, que foi diretor da Inteligência Militar.

A comunidade judaica publica o jornal Salom, em turco, com uma página semanal em judeo-espanhol. O jornal também possui um centro cultural e organiza exposições em galerias de arte. A herança cultural judeo-espanhola vem sendo preservada graças ao trabalho do quarteto "Os Pássaros Sefaraditas". Obras literárias cuja trama ocorre na Turquia também foram publicadas ao longo dos anos, entre as quais América, América, de Elia Kazan; Shabetai Sevi, o Messias Místico, de Gershom Scholem, entre outras.

 

Bibliografia:

"Istambul", artigo publicado no Guide to the World's Jewish Communities and Sight, editado por Alan M. Tigay

"Turkey", artigo publicado no Jewish Communities of the World, editado por Avi Beker - Institute of the World Jewish Congress, Edição 1998-1999.