O mel, com sua doçura, é um dos símbolos principais de Rosh Hashaná. Mas sua produção está sendo ameaçada e os cientistas têm lançado um alerta sobre o forte declínio no número de abelhas no mundo.As abelhas estão no centro de um debate internacional.

Vários governos estão alarmados com o forte declínio no número de abelhas, cujo papel é fundamental nos ecossistemas. Dizimadas em algumas regiões, seja pela propagação de pragas incontroláveis por pesticidas, seja pela ação do homem no meio ambiente, as abelhas ocupam um espaço importante na agricultura – inversamente proporcional ao seu reduzido tamanho. Sua extinção teria efeitos desastrosos, não apenas pelo fim da produção de mel, mas, principalmente, pelo seu papel na polinização de milhares de hectares destinados à agricultura. É preciso ressaltar que 3/4 das espécies utilizadas pelo homem na produção de alimentos dependem da polinização para uma produção de qualidade e em quantidade.

A polinização é o processo que garante a produção de frutos e sementes e a reprodução de diversas plantas, sendo um dos principais mecanismos de manutenção e promoção da biodiversidade na Terra. Para que aconteça, entram em ação os polinizadores, como abelhas, vespas, borboletas, pássaros e morcegos responsáveis pela transferência do pólen entre as flores masculinas e femininas.  Das espécies conhecidas de plantas com flores, 88% dependem, em algum momento, de polinizadores. Em Israel, o tema vem sendo estudado profundamente por especialistas em apicultura, agricultores e segmentos governamentais.

Na Antiguidade

O mel faz parte da história de Israel desde a Antiguidade. O Livro da Sabedoria exalta a bondade do mel, mostrando como as palavras agradáveis são como um favo de mel, doces para a alma, e representam saúde para os ossos.

Na Torá, a Terra que nos foi Prometida pelo Todo Poderoso foi descrita como uma terra que emana leite e mel, um sinal da abundância e prosperidade nela encontrada. Estudiosos judeus e não judeus têm procurado decifrar o significado por trás desta frase. Há os que tentam identificar o mel que fluía como sendo de tâmaras ou do néctar de alguma fruta e não necessariamente de abelhas. No entanto, não há dúvida de que o mel encontrado na Terra de Israel era originário de abelhas desde épocas muito antigas.

Elas construíam suas colmeias em grutas, em penhascos e, algumas vezes, em um esqueleto de leão, como mostra a narrativa referente a Sansão quando estava a caminho de seu casamento na terra dos filisteus: “No esqueleto do leão, ele (Sansão) encontrou um enxame de abelhas e mel. Ele o colheu com suas mãos e o comeu e foi caminhando. De fora daquele que come veio algo para comer. Do forte veio algo doce” (Juízes 14: 8-14).

Há outros relatos bíblicos que confirmam a crença de que o mel jorrava na Terra de Israel produzido por abelhas silvestres: “Ele alimentou-se de mel do penhasco” (Deuteronômio 32:13). “Eu te saciei com mel da rocha” (Salmos 81:17).

Uma descoberta feita em 2007 pelo acadêmico israelense, Amihai Mazar, professor do Instituto de Arqueologia da Universidade Hebraica de Jerusalém, colocou um fim na discussão sobre a prática da apicultura na região. Durante escavações feitas em Tel Rehov, no vale de Beit Shean, no norte de Israel, ele encontrou um apiário datado do século 9 a.E.C. O mais antigo encontrado, até então, possuía entre 100 e 200 colmeias que outrora abrigaram mais de um milhão de abelhas. Foram encontrados, também, 25 cilindros onde eram depositados os favos. Feitas de palha e de barro, cada colmeia media 80 centímetros de cumprimento e 40 de diâmetro. Estavam dentro de um recinto feito com tijolos, que foi destruído por um incêndio. Os pesquisadores estimam que o apiário tivesse uma produção anual de cerca de 500 quilos de mel e 70 de cera.

Segundo declarações de Mazar na época do achado, trata-se de uma evidência, sem precedentes, da existência da apicultura avançada na Terra Santa em tempos bíblicos, muito mais do que se acreditava, até então, confirmando a denominação de “terra que emana leite e mel”, tantas vezes mencionada no Tanach1, a Bíblia. Diz, ainda, pelas suas pesquisas, que a apicultura era amplamente praticada na Antiguidade, onde o mel tinha aplicações religiosas e medicinais, além de alimentares, e a cera era usada na fabricação de moldes e como superfície de escrita.

Outra descoberta que surpreendeu os arqueólogos foi a de que as abelhas do apiário de Tel Rehov não eram as chamadas abelhas sírias, comuns em Israel até algumas décadas atrás. Eram abelhas do gênero Apis Anatolia, oriundas da Turquia, e que produzem de cinco a oito vezes mais mel que as “sírias”, sendo também mais fáceis de criar para uso comercial, e mais tranquilas.

Foram tais características que, segundo Mazar, possibilitaram a construção de um apiário em uma cidade como era Tel Rehov na época bíblica.

Dados alarmantes

Por que esse interesse aparentemente repentino sobre o início da apicultura, em Israel, e que espécies havia na região, na Antiguidade? Porque, como outros países, Israel também se encontra, hoje, ameaçado da extinção de suas abelhas.  Na realidade, estudiosos já afirmam que, atualmente, não mais se encontram em Israel espécie ou subespécies da época de Sansão e que, a continuar a tendência mundial atual de morte de abelhas, estas não mais poderão ser encontradas sequer em fazendas israelenses.

O tema é crucial para Yossi Slavsky, chefe do Departamento de Cultivo do Ministério de Agricultura e do Serviço de Desenvolvimento e Extensão Rural. Como responsável pelo setor, ele não está apenas preocupado pelo fato de haver inúmeros tipos de grãos produzidos pelo país que dependem da polinização. Tais grãos constituem um terço da produção israelense.

Em um artigo publicado na edição de janeiro de 2015 da revista israelense “Eretz”, Slavsky e outros especialistas, incluindo acadêmicos e apicultores, analisam a situação.

Em muitos países a situação é preocupante, inclusive nos Estados Unidos. Em maio desse ano, um relatório preliminar do Departamento de Agricultura americano apontou para o fato de que os apicultores do país perderam 42% de suas colônias de abelhas no ano passado, a segunda maior perda anual registrada até hoje.

As abelhas são importantes polinizadores de culturas-chave para os EUA, como amêndoas e maçãs. As causas desse colapso ainda não estão completamente explicadas pela ciência. Várias teorias foram formuladas e os ambientalistas culpam o uso indiscriminado de agrotóxicos. O presidente norte-americano, Barak Obama, já anunciou um plano para tentar reverter o quadro, com medidas que incluem a redução do uso de pesticidas, entre outras.

De acordo com Slavsky, “Abelhas produtoras de mel estão morrendo em grande número, nos últimos anos, por razões que continuam mal compreendidas. Ácaros, parasitas, doenças, pesticidas e poluição e diminuição da área verde foram apontados como culpados pelo Distúrbio do Colapso das Colônias (DCC), que tem causado uma dizimação na população mundial de abelhas. O DCC espalhou-se rapidamente pelos Estados Unidos e Europa, nos últimos anos, não deixando praticamente nenhum país com sua população de abelhas intacta... O colapso das colmeias coloca em risco não só as abelhas, mas toda a cadeia de alimentos, já que as lavouras de grãos e frutas dependem da polinização”.  Ainda de acordo dom Slavsky, o ácaro Varroa destructor é considerado, a principal praga que afeta as abelhas. Esse ácaro ataca as colmeias, onde se reproduzem, e abre as portas para um vírus que infecta as abelhas. O ácaro foi responsável pelo colapso de colmeias no Havaí, no Canadá e, também, em Israel.

Situação atual em Israel

A moderna indústria de apicultura em Israel se baseou nas chamadas abelhas sírias e suas subespécies, que sobreviveram ao longo de milhares de anos na região, adaptando-se às condições climáticas e às plantas locais. Desenvolveram um sistema de defesa que lhes permitiu sobreviver a predadores e à ação do homem, bem como às intempéries climáticas, como secas e fortes ondas de calor. Esta capacidade espalhou-as pelas terras de Israel, onde criaram colmeias, com uma abelha rainha e enxames de trabalhadoras.  Sua agressividade e irritabilidade, que garantiram sua sobrevivência, no entanto, tornaram-nas menos atraentes para os apicultores.

Assim, em 1914, os produtores resolveram fazer uma experiência e importaram abelhas da Itália. Estas, além de produzirem maiores volumes de mel, são mais tranquilas e mais fáceis de criar, com capacidade de se adaptar tanto a altas quanto baixas temperaturas.  O processo de substituição das abelhas sírias pelas italianas levou cerca de 80 anos e levou à extinção das abelhas sírias em Israel, principalmente a partir da década de 1980, quando foram dizimadas pela praga Varroa.

Israel possui atualmente cerca de 500 apicultores, instalados das Montanhas do Golã ao deserto de Aravá. Segundo Hertzel Avidor, diretor executivo do Departamento de Mel de Israel, cerca de 100 deles então envolvidos com atividades comerciais, possuindo milhares de colmeias, enquanto os demais são pequenos produtores.  No total, há cerca de 100 mil colmeias em Israel, com uma média anual de produção de 3 mil toneladas de mel – 30 quilos por colmeia ao ano. A demanda interna, no entanto, é maior, algo em torno de 4 mil toneladas anuais, pois o consumo médio per capita é de meio quilo por ano. As colmeias estão espalhadas em cerca de 6 mil instalações por todo o país e estão sob supervisão direta do Departamento de Mel.

A cadeia produtiva das abelhas inclui a criação em separado de abelhas rainha, para serem colocadas em colmeias onde são fertilizadas pelos machos, que morrem em seguida.  Todas as demais tarefas nas colmeias são desempenhadas pelas fêmeas.   Noga Reuven, apicultora da Galilee Flowers Apiary, em Mitzpe Manot, na Galileia Ocidental, é responsável por cerca de 650 colmeias,  que produzem mel, e centenas de outras para criação de rainhas. Este apiário está envolvido em várias atividades da cadeia produtiva, com a fabricação de 11 tipos diferentes de mel natural vendidos em todo o país, incluindo mel de abacate, eucalipto, ameixa, entre outros. Durante a primavera, o apiário executa tarefas de polinização em campos de abacate, kiwis e lichias.

Experiência de sucesso

Um dos problemas mencionados por Slavsky – a diminuição das áreas verdes em função do crescimento urbano e ocupação humana – levou a uma experiência que parece estar dando certo em Israel. O caso é citado por Sima Kagan, da Organização Israelense de Pesquisa Agrícola (Israel Agricultural Research Organization – ARO), apesar das restrições iniciais.

Como em muitos países de regiões desérticas, os apicultores de Israel enfrentam dificuldades porque a grande maioria das plantas nativas floresce somente na primavera. Isso significa que, em outras estações, as abelhas têm que ser alimentadas com soluções de açúcar ou transportadas a lugares do país onde as flores ainda não caíram – o que é muito caro. Mas um trabalho conjunto do Dr. David Brand, chefe do departamento florestal do Keren Kayemet LeIsrael (KKL); Dr. Dan Aizikovich, professor da Universidade de Tel Aviv; e do Departamento do Mel, encontrou a solução: eles transplantaram para Israel um tipo de eucalipto australiano que floresce o ano todo.

As primeiras mudas foram trazidas em 1998. Depois de dois anos de experiências, os professores israelenses iniciaram a produção. Desde então, mais de cem mil árvores foram distribuídas anualmente aos apicultores – um total de dez milhões nos últimos dez anos. Segundo a previsão do Dr. Brand, do KKL, a produção de mel israelense vai aumentar significativamente...

1  O Tanach é composto de 24 livros. Esta palavra simboliza o conteúdo desses livros
e contém a inicial de cada grupo de livros: Torá, Nevi’im (Profetas) e Ctuvim (Escrituras Sagradas).

BIBLIOGRAFIA
Revista Eretz, The Magazine of Israel, Nº 149. Jan-Fev 2015